Alguma Parada

Por Mogli Saura*

Eu to em outra
não to na sua
nem to na minha
eu to na nossa
em devir..

Ser humano em greve de ser humano
ser humano em greve – de ser – humano em greve
de ser humano
ser humano em greve… De ser…

Eu falo tanto eu falo sempre as mesmas coisas,
eu não me aguento e quero ter objetivo
não me contento e quero ser mais que aquilo
que projetei, produzo articulo e digo:
tudo o que sou abstração em corpo vivo
conceitual – distante do já definido –
mas na real, massa de gordura e carne circuitadas em conexão,
estimulo, percepção, sensação…


O ar entrando e saindo…

Monstruosidade passiva!
eu não tive a intenção de te assustar,
e sinto muito se você não entendeu
e muito mais se você não nos aceitar,
to te dizendo, eu to em outra – estrangeira –
desconhecida (até por mim) distanciada do que já identifique
daquilo que um dia fui
me profanei neguei a identidade e sigo.


Entediei: e na casa do tédio foi
que encontrei,
em uma mina de carvão alguma parada,
preciosa sagacidade negra-solitária,
silencio
necessidade de uma parada.


Animal em repouso que se entoca
que traz a ferida no corpo
recolhe e acolhe o sentido
daquilo que te orienta e te da o que –
mas muito além dessa palavra, e na real:
ossos cartilagem e sangue, respiração
acolhendo o próprio corpo sem sublimação,
porque para o sentido,
só sensação
constatação do já sentido alguma parada.


Para desejo, para querer, para….
Para alguma parada,
algum vazio, um não lugar, um vagar pelo espaço que para.

É um estado intensivo de percepção
nem sim nem não e é o que é
e em si mesmo descobre o nada da criação
em um deserto após o tédio (durante a festa onde entediei)
e compreendi num ritual que o desejo é um pretinho bem pirracento
e corre solto, perdido, de galho em galho
atazanando, só instigando
intervenção, meditação
a suspensão corpórea-temporal da atividade
enquitante
alguma parada
algum manejo, soberania de si
auto cuidado
o cavalgar nesse deserto com meu pretinho
com toda a força desse menino monstro
que é o meu fogo é minha vida
minha mulher, a puta velha experiente,
com seus cabelos coloridos,
que se arriscou no risca faca dessas estradas
encruzilhadas
viveu a festa saiu ilesa
e em estado de graça – atônita – se permitiu dizer:
e para tudo nessa porra.


Greve geral, greve geral!
Param todas as categorias!
Pára gênero, pára raça, pára classe…


Param todas as categorias.
Ser humano em greve… de Ser.

_____

Mogli Saura é artiste, Instrutore de Yoga e Permacultora.

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